World Burns To Death - "Venha e veja a beleza da desumanidade..."

Depois de alguns posts com o nosso novo estreante Eric, cá volto ao blog com uma recomendação nova. Dessa vez vou falar de uma das bandas favoritas da minha vida: World Burns To Death.


Formada por volta do ano 2000, a banda texana tem seu nome provindo do álbum homônimo do grupo finlândes Bastards. O World Burns To Death faz um punk/hardcore com elementos de várias regiões e gêneros do mesmo: Peso do crust punk, bases e crueza da finlândia, os solos e velocidade da cena japonesa e os vocais mais guturalizados das bandas suecas. Sua música arrancou elogios de nomes como John Peel e foi considerada uma das bandas americanas prediletas do Fenriz (Darkthrone).


Mas o apelo dos caras não fica apenas na música, as artworks e letras do grupo são outro grande marco dos caras. Montagens e colagens fotográficas caóticas com uso de simbologias fortes como o próprio logotipo, que é usado em munições provindas de Israel. Liricamente o WB2D fala em guerra e decadência humana no geral, porém boa parte de suas letras menciona filósofos, poetas e escritores americanos: O banco de citações dos caras conta com Voltaire, Brecht, Stirner e James Shirley.


Em 2002, é lançado o debut The Sucking Of The Missile Cock, a obra em suas letras se tratavam de uma crítica as posições dos EUA na época pós 11/9 e a paranóia yankee em relação as tropas, terrorismo e os fantasmas da Guerra do Golfo. Outra carascerística marcante é a divisão de vocais, além de Jack Control (vocalista), o guitarrista Zack Tew canta em outras faixas do álbum. Entre os destaques estão o crust quasi escandinavo Wind Of Cruelty,  a linha de baixo e refrão massacrante de Fall on Your Sword  e a ácida faixa introdutória Glorious Butcheries.



No meio tempo, a banda lançou vários EP's como Acid In The Face Of Human Rights, Art Of Self Destruction e No Dawn comes... Night Without End, além de dois splits, um com os brasileiros do Sick Terror (que rendeu uma turnê no país tropical) e o outro com a banda de raw punk Disclose (o que firma mais ainda a ligação de WB2D com o punk nipônico.


Em 2006 Totalitarian Sodomy vem ao mundo, com a artwork feita pelo insano Sakevi (conhecido pela infame banda de metal/hardcore G.I.S.M.), com uma gravação mais metalizada, cadências mais lentas, vocais mais guturais e uma grande quantidade de solos e mudanças de tempo. Sem dúvidas o álbum mais brutal e com as letras mais críticas, abordando o totalitarismo de várias formas, seja com o Holodomor (Those Who Had Come To The End) ou o genocídio Tutsi (Triumph Of Evil), além das óbvias referências a Hiroshima e Nagasaki (Frenzied Hacking Of Swords e Children Gone To Shadow). No mesmo ano os fãs levam um susto: Após um show, Jack Control foi esfaqueado, a faca quase perfurou o coração do vocalista, porém tudo terminou bem.


Após mais alguns splits com bandas japonesas e o contato cada vez mais forte com os nipônicos (contando com paticipações no festival Burning Spirits), Graveyard Of Utopia sai em 2008. Essa aproximação com a cena dos espíritos ardentes é  completamente notável na obra, o excesso de riffs, leads e solos e até a participação de membros de bandas como Death Side e Gudon no álbum marcam o tom do disco. Completamente upbeat e com refrões grudentos, porém o conteúdo sempre mantendo o tom distópico que marca a escrita de Jack, destaques ficam para They Want A War  e Black Hundreds, com um solo épico feito pelo finado Chelsea Kishida.


Até 2010 mais alguns splits e EP's foram lançados e depois a banda entrou num hiato, onde cada membro resolveu focar em seus trabalhos: Jack Control hoje mixa e masteriza álbuns pela Enormous Door (entre alguns de seus clientes se encontram Darkthrone, Jet, Kromosöm, Meat Puppets e The Darkness), Zac Tew continua com o Kegcharge e montou o projeto Smash Detox (superbanda japonesa que conta com membros do Forward, Judgement e Bastard). Os outros membros (Craig Merritt  e Jon Guerinot) não há notícias de seus paradeiros.


Apesar do hiato, a banda nunca falou oficialmente que teria encerrado as atividades, quem sabe eles não voltam um dia e lançam mais algo?

The Afhgan Whigs: O amor é um cão dos diabos

                  

Na semana passada foi divulgado um clipe (bom por sinal)  e a notícia certa de que, 16 anos depois do seu último trabalho de estúdio, o Afghan Whigs, iria lançar com certeza um novo álbum em abril próximo. A melhor notícia musical do ano. Um dos raríssimos casos em que o comeback se justifica e que pode ser encarado mais como vontade de voltar a tocar juntos do que pelo fator grana. Numa época pré-internet ser apresentado de alguma forma ao universo Whigs era o equivalente a ter descoberto um segredo e a entrada num seleto grupo. Uma espécie de prazer oligárquico, já que pouquíssima gente conhecia, entendia ou gostava. Com certeza a banda mais ousada, intrigante, inteligente e realmente sofisticada dos 90’s. Formada em 1986 na provinciana Cincinnati, Ohio, há uma versão de que os integrantes se conheceram dividindo uma cela durante uma estada de uma noite na prisão;  mas segundo a banda isso não passa de boato, tendo o centro da banda (Gregg Dulli(V/G), Rick McCollum (G) e John Curley (B)) na verdade se conhecido de uma forma bem mais trivial, entre amigos com gostos e propostas parecidos. 

Fazendo cosplay de Mudhoney
No início as influências mais fortes eram Replacements e Hüsker Dü: canções no pique veloz do punk rock, mas com melodias e refrãos caucados no powerpop. Isso é sentido no primeiro disco da banda, "Big Top Halloween", de 1988.                            

   

O trabalho tem certa repercussão e começam a fazer shows fora de sua cidade-natal. Num desses shows entre a platéia estava Jonathan Poneman, um dos donos da Sub Pop, que se impressionou com a intensidade da apresentação e principalmente com o carisma e passionalidade do líder, vocalista e compositor de quase todas as músicas Greg Dulli. “Você não conseguia desgrudar os olhos da figura dele um décimo de segundo qualquer ”, disse Poneman.



Assinam então com a Sub Pop e gravam dois discos por ela, sendo a primeira banda fora do Noroeste americano a assinar com a gravadora. No primeiro álbum pela SP “Up it in” já se nota maior esmero nas composições e o desenvolvimento do que seria a personalidade do AW: canções sobre relacionamentos no que eles tem de pior: seu fim ou a proximidade do fim, e tudo o que costuma vir junto: dúvidas, mentiras, incertezas, autodepreciação, ódio, desespero; culminando muitas vezes em compulsões, vícios, crimes, suicídio. Em “Congregation” deram muitos passos nessa direção, com seu som sujo e profundamente climático. Dentre as curiosidades há um cover interessante de “The Temple”, composição de Andrew Lloyd Webber presente na trilha sonora do filme Jesus Christ Superstar. Aqui também é onde aparece a  principal característica deles, que é a inusitada mistura do som mais introspectivo do chamado indie rock com elementos de black music, aqui vindo através da funkeada “Turn on the water”. De "Congregation" há "Miles iz dead" (faixa-escondida e que tem o título em homenagem ao falecido jazzista Miles Davis, que havia falecido pouco antes). Para ela o vídeo de baixo orçamento mais sensacional já feito, abordando junkies, "barflies", sexo casual como forma de fuga e tentativas abortadas de felicidade.      

                              

O undergrond acabou ficando pequeno  prá eles e assinam com a Columbia, lançando "Gentlemen", que é tido como o Whigs na sua melhor forma. A produção limpa e mais polida de um grande estúdio casou melhor com esse novo direcionamento mais melódico e introspectivo . Há mais preocupação com climas e ambiências, com sintoma no uso maior de teclados e orquestrações. Aqui há uma das poucas faixas não cantadas por Dulli e um dos maiores clássicos deles. “My Curse”, interpretada por Marcy Mays, do Scrawl, também de Cincinatti, é uma das mais bonitas baladas já feitas, dando uma interessante perspectiva feminina de uma visão sempre masculina da história.

  

Apesar da aclamação da crítica, não conseguem virar megabandas como os Smashing Pumpkins ou Soundgarden ou mesmo emplacar um grande hit, como o 4 Non Blondes, prá citar um exemplo de "one hit wonder" do período. Apesar de o som do Whigs ser mais acessível (no sentido de não ter guitarras orientadas para o heavy metal ou punk) que o da maioria das bandas grunge, não eram tão objetivos quanto seus pares e consequentemente não conseguiram uma identificação tão imediata com o “teen spirit”, que era a ordem do dia.

 

O álbum seguinte, "Black Love", de 96, é uma espécie de continuação do que fizeram em "Gentleman". É também  o trabalho mais sombrio, hermético e radical deles. Uma ópera rock ou trilha sonora de um filme inexistente, com músicas ligadas umas às outras e que funciona melhor se ouvido inteiro.  A aura noir e negativista aparece em todo lugar, com as fotos de mau agouro do encarte do CD reforçando isso. É o trabalho mais Dulli de todos, para o bem e para o mal. Aqui ele expõe da forma mais explícita suas obsessões, taras, crises de humor, paranóias. A voz cigarreira e lamuriosa pragueja e entra em êxtase pervertido pelos abismos do sofrimento de forma sublime; enquanto a guitarra precisa, de bom gosto e cheia de wha wha de McCollum  adornam e confirmam com enlevo poético o que é cantado. Black Love não foi tão bem recebido quanto seu disco anterior pelas revistas especializadas, tachando-o de pretensioso e forçado; mas é um dos prediletos dos fãs. Um dos principais objetos de crítica é  que a dor passada por Dulli era algo mais lido e assistido em filmes do que se fosse vivenciado. Mas apesar dele não ser um psicopata ou maníaco sexual, sua personalidade complexa e autodestrutiva, somada com muitos anos de abusos químicos e seus consequentes passeios pelo wild side, convencem de um elevado nível de inquietação e caos mental.

 

Há um hiato de dois anos e lançam “1965” (ano de nascimento de todos os integrantes da banda), último álbum deles e que ia numa direção mais comercial, com uma guinada para um estranho tipo de som festeiro, dentro do que pode imaginar de uma festa tendo-os como trilha sonora. O fato é que o rancor dá lugar a uma sensualidade e balanço black mais gritante do que o apresentado nos trabalhos anteriores. "1965" é magistral e desafiador. Um enigma, como quase tudo que fizeram. As letras sexualizadas do ponto de vista do macho, comuns na black music de forma geral mas que são encaradas como misóginas em um meio que tende para o politicamente correto, gerou muitas controvérsias


 . 

Em 2000 se separam amigavelmente, com Dulli seguindo com o projeto twilight Swingers e mais tarde com o Gutter Twins, ao lado do ex-Screaming Trees. O primeiro passo para o retorno da banda se dá em 2011, com a participação de McCollum em um show da Gutter Twins. Alguns meses depois houve o retorno oficial.

 

Notícias recentes informam que McCollum que não mais participa do grupo e que inclusive não gravou no álbum novo, intitulado “Do The Beast”. Com certeza isso tira muito o brilho de tudo mas a curiosidade de ouvir material recente deles depois de todo esse tempo e a possibilidade de assistir uma apresentação no Brasil (eles prometeram isso) é algo de muito bom para 2014.
 

Ministry: Ding a Ding Dang My Dang A Long Ling Long


Geez, it's been 20 years...

A clássica introdução de Candy, epifania do Iggy Pop, pode ser usada para indicar a passagem do tempo dos presentes dias ao momento em que o Ministry vivia sua fase de maior sucesso e relevância musical. Mas sua busca incessante por inovação (mesmo que muitas vezes equivocadas) e a autenticidade de seu trabalho faz a audição do Ministry nos anos '10 não só recomendável mas necessária para quem quer entender os rumos que tomou o rock pesado e conhecer um trabalho instigante e fora dos padrões.
Nascido em 1958 e  filho de refugiados cubanos Al Jourgensen (líder e cabeça do Ministry) era novo demais para ter sido hippie; e durante a explosão do Punk Rock, não deu muita importância prá geração vazia de NY nem prá anarquia no Reino Unido, pois já havia sido catequizado pelo hard rock do período de bandas como Lynyrd Skynyrd, ZZ Top e Led Zeppelin. Admirava a capacidade de seu ídolo-mor Jimmy Page de usar o estúdio como um instrumento musical e a enxergar a produção como parte integrante da música. Al tentou por um tempo ser guitar hero, mas não tinha grandes habilidades com o instrumento e logo desistiu. Daí partiu para uma carreira no baseball em sua cidade Chicago que também não durou muito.
Just a Juvenil 
Com a chegada do sinthpop e New Romantic, Al se encanta pelo som dos sintetizadores e enxerga nessa vertente algo que ele poderia fazer, já que o estilo de bandas como Duran Duran estava fazendo bastante sucesso e não requeria grandes habilidades musicais. Desse período veio o debut "With Sympathy", apresentando um pop eletrônico e diferente dos trabalhos que consagraram a banda. Críticas negativas vieram de toda parte, a mais célebre do conterrâneo Steve Albini, que na época escrevia para uma revista de Chicago e até hoje é um eterno detrator de Jourgensen.


Em 1986 veio Twitch, disco mais pesado e rock do que o anterior mas ainda com característica bem pop e dançante. A mudança veio a ocorrer na turnê desse disco, com a entrada de Paul Barker, que era do punk rock, vindo da banda Blackouts. A entrada de Barker foi fazendo o som gradativamente ficar mais denso; e inclusive foi quem apresentou o "Speak English or Die" do SOD para Al, que ficou fissurado no senso de humor sem limites e do hibrído de punk e metal. "Speak English Or Die" é referência máxima no novo direcionamento do grupo.
 
Paul Barker


Dai começaram a pesar a mão nas guitarras e em 1988 veio a primeira das obras-primas deles, "Land of Rape and Honey." Letras como " Just like a car crash, just like a knife, my favorite weapon is the look in your eyes" já  marcam uma total ruptura com o que fizeram no passado. Um novo monstro havia nascido. Um som perturbador de guitarras sintetizadas ultradistorcidas, vocais enterrados claustrofóbicos, samplers de diálogos de filmes, barulhos de máquinas, letras niilistas e inteligentes. Nessa época a dupla também adotou os codinomes Hypo Luxa e Hermes Pan (Alain Jourgensen e Paul Barker, respectivamente).
Era o Ministry se ligando ao rock industrial . O rock industrial ou som industrial, criado pelo Throbbing Gristle e praticado por Cabaret Voltaire, KMFDM, Whitehouse;  tendo também elementos dele em bandas de hardcore mais noisy como Flipper, Swans, Big Black e Scratch Acid, até então não havia saído do underground do underground. Com o sucesso do Ministry o gênero ganha visibilidade e o termo e som saem do gueto. O Ministry levou o som das máquinas a outro patamar, com a adição de guitarras pesadas e a glamourização do grotesco para as grandes massas.


Era fins dos 80's e o hard farofa e o pop da época dão sinais de desgaste. Os Estados Unidos passavam por uma grave crise econômica, devido principalmente a gastos militares através dos anos com a Guerra Fria (alguma semelhança com a situação de hoje e a Guerra ao Terror?). Desemprego, incerteza quanto ao futuro, escalada da violência e do uso de drogas pesadas. As paradas de sucesso pediam algo mais realista e agressivo. O modelo yuppie tinha ido prá vala. O Guns N' Roses com seu Appetite for Destruction, mostrando uma proposta diferente, representando o americano branco e pobre (white trash), obteve grande sucesso e mostra um reflexo do período. O rap, que desde seu surgimento só falava de ostentação e rixas de gangues, ficou mais sério, com a política e o afrocentrismo do Public Enemy e o niilismo e Shock Rap do NWA, trazendo terror para os cidadãos de bem. Todos eles nas paradas de sucesso e capas de revistas. O Ministry tinha vindo na hora certa, no lugar certo e feito pelas pessoas certas.

Em 1990 outro caos, "The Mind Is A Terrible Thing to Taste", continuando a saga do anterior. Letras sobre serial killers, violência urbana de forma geral, os aspectos mais sombrios do mundo com as percepções aumentadas pelo consumo maciço de drogas. Com ele uma estrondosa turnê e o disco ao vivo  "In Case You Didn't Feel Like Showing Up" em que a banda se apresenta num cenário em que são separados da platéia por uma tela de arame, o que torna as apresentações ainda mais tensas. Os shows violentos da banda começam também a atrair a atenção de skinheads white-power, que enxergavam conteúdo nazi na letra de "Land of Rape and Honey", apesar de o Ministry sempre ter repugnado a Extrema-Direita e ter um pensamento libertário.


No ano seguinte e como resultado da destruição total nos shows, cansaço da estrada e abusos químicos por parte de Al Jourgensen e Paul Barker nasceu "Psalm 69", um dos álbuns mais perturbadores, descrentes, violentos, soturnos e inacessíveis  já feitos, onde os elementos trabalhados nos dois últimos álbuns de estúdio estão aqui elevados à enésima potência, com letras mirando contra a religião cristã, o governo republicano de George Bush I, a mídia sensacionalista, a estupidez yankee. Não resta esperança, só momentos de  fugas através das drogas que por si só se transformam em outro pesadelo (vide  o clipe de "Just One Fix", com participação de William S. Burroughs, o junkie prototípico).
 

Tudo isso fruto das experiências no Wax Trax Studios, um laboratório em que todo tipo de experiência depravada, demencial, experimental e zoenta era testada por toda a nata de viciados, freaks e praticamente toda  a fauna humana peculiar da época. 

Al Jourgensen e David Yow (Scratch Acid/ Jesus Lizard)
O Ministry trouxe neurônios pro metal, o que sempre foi escasso dentro desse universo. Sem soar pedante ou artificial, a banda conseguiu trazer inteligência e realismo a um universo lírico povoado por dragões, Satan, violência gratuita, medievalismos, pseudo-ocultismo de RPG, ou letras sobre a good life de carros, Penthouse, laquês e orgias.

Passaram-se 4 anos de turnê e veio em seguida Filth Pig, que saia da linha que estavam seguindo nos últimos álbuns. Sem elementos eletrônicos, mais lento e sendo quase que um disco de thrash, dividiu opiniões. Há nele um cover inusitado de "Lay Lady Lay" (era moda nos 90's as bandas de rock fazerem cover de bandas pop que aparentemente não tem nenhuma relação com o som feito por elas). Com Filth Pig marca-se também o fim do período mais criativo do Ministry.
 

Eles foram lançando discos mais convencionais e voltados para o metal, deixando os experimentalismos para os diversos álbuns de remixes, versões dub e diversos projetos paralelos. Os discos seguintes eram ora lentos e deprês como "The Dark Side of Spoon", ora raivosos como em "Animositina" (último trabalho com Paul Barker),  a trilogia anti-bush de "Houses of the Molé", "Rio Grande Blood" e "The Last Sucker" e nos últimos "Relapse" e "From Beer to Eternity", esse com uma pegada mais industrial, que não se via desde o "Psalm 69" e que também é o último trabalho do guitarrista Mike Scaccia na banda, que colaborava desde 1990 e teve uma trágica morte por overdose. Essa perda foi bastante sentida por Al, o que culminou com o fim do Ministry.

Mike Scaccia




É lançado o dvd "Fix", documentário on the road da banda em diversos períodos e que conta com as participações de Jello Biafra, Trent Reznor, Ogre, William Burroughs, Timothy Leary dentre outros. Em 2013 AJ lança sua autobiografia (livro tragicômico e que narra as doideiras, experiências de quase morte, sodomias, blowjobs e aberrações de pelo menos 30 anos dentro do universo do showbiz, no mainstream e underground. Dentre as muitas declarações e desabafos ele fala dos plágios gritantes de seu visual por parte do Rob Zombie e do personagem Jack Sparrow, de Piratas do Caribe, interpretado por Johnny Depp).
Apesar de o Ministry ter encerrado suas atividades oficialmente, isso não pode ser levado muito a sério, porque já anunciaram o fim da banda outras vezes. Al Jourgensen continua sua eterna luta contra as drogas e recentemente em sua página no Facebook afirmou que estava se internando para se tratar de problemas ligados ao alcoolismo. Como tem bons genes e é um sobrevivente à moda de Lemmy e Keith Richards, o mais provável é que em breve estará na ativa de novo. Aguardamos ansiosamente, porque Al mesmo não estando na sua melhor forma, é figura mais interessante e digno de crédito que 99,9% do universo pusilânime e coxa que tem rolado por ai. Vida longa ao Alien!
 

Tudo o que eu aprendi na vida, eu aprendi com os Butthole Surfers


O Butthole Surfers que é lembrado mais pelos clipes de “Pepper" e "Who Was In My Room Last Night” que tiveram alguma rotação na MTV, ainda continua a ser um ilustre desconhecido até do público alternativo. Dentre os motivos desse ostracismo podemos dizer que alguns são: é considerada uma banda difícil, experimental e muita gente tem preguiça até de começar a ouvir; o fato de o próprio nome da banda por muito tempo não poder sequer ser mencionado nas rádios, sendo chamados como B.H. Surfers quando queriam se referir a eles; e vai até o aparente desinteresse dos cabeças da banda (Gibby Haynes e Paul Leary) que nos espaços oferecidos pela imprensa, no geral dão entrevistas nonsense puro, parecendo querer esclarecer pouco e manter o culto subterrâneo. São o típico caso de "banda da crítica" , em que o sucesso de público não acompanha as citações e louvores de jornalistas em revistas e sites especializados. O fato é que  para quem se aventurar a sair do lugar comum e passar por alguns obstáculos, encontrará uma banda obrigatória prá quem acredita em matar todo mundo agora, legalizar o assassinato em primeiro grau, defender o canibalismo, comer merda e que tem a sujeira como política e estilo de  vida.
 

O Butthole Surfers iniciou suas atividades em fins da década de 70, quando Gibson "Gibby" Haynes, então estudante de contabilidade e filho de um famoso apresentador de programas infantis conhece na universidade o estudante de arte Paul Leary. Com gostos musicais bem parecidos e pretensões artísticas idem começam logo a ensaiar e fazer apresentações no circuito punk local de San Antonio, Texas, estado americano conhecido pela caipirice ultraconservadora e distante dos grandes centros culturais dos EUA.

Gibby Haynes çedusindo
Sempre foram um alienígena dentro do universo independente americano. Já logo em seu debut, clássico instantâneo "Brown Reason To Live EP"  nota-se claramente que eles tinham mais a ver com o pós-punk de pretensões mais artísticas (art-punk) de bandas como PIL, Fall, Birthday Party do que seus compatriotas do punk/hc. O BS é hardcore no sentido de serem extremos, mas não eram ultra-rápidos nem as letras tinham conteúdo político explícito. Musicalmente não havia limites, eram punk, funk, psicodélico, alternativo, folk, hardcore, metal, eletrônico, experimental...  E letras como “There’s a time to shit and a time to God. The last shit that I Took was pretty fuckin’ odd. There’s a time for drugs and a time to be sane. Jimi Hendrix makes love with Marilyn remains” confundiam e  irritavam quem esperava uma proposta mais “séria” e linear. A incorreção política do grupo fez com que fossem sempre uma banda sem cena.



Em seguida vem o ao vivo "PCPPEP" e o primeiro LP deles "Psychich Powerless Another’s Man Sac" (em geral esses títulos inusitados dos discos do BS, era porque Haynes e Leary cada um queria um título para os trabalhos, então "resolvia-se" a coisa fazendo a junção dos dois títulos, duas ou três palavras combinadas que não faziam sentido algum).

Após o primeiro disco, fizeram sua primeira grande turnê pelos EUA em uma Chevy velha e toda grafitada, com arame farpadoenroscado pelos parachoques; levando sempre junto sua mascote, a cadela pitbull "Mark Farner Of Grand Funk Railroad".
Butthole Surfers com Mark Farner Of The Grand Funk Railroad
Visualmente os shows estimulavam e agrediam os sentidos: as letras eram gritadas através de um megafone, luzes estrobóscopicas, sangue artificial, nudez, pirotecnia, uma dançarina contratada, dreadlocks pintados de roxo e pink, duas baterias no palco, um projetor exibindo fotos médicas de anomalias e doenças, alternadas com outras de paisagens naturais e personagens de desenhos animados. Quem testemunhou disse que lembravam um circo de horrores, uma bad trip esquizofrênica que era potencializada pelo hábito de grande parte da platéia consumir LSD durante os concertos, então platéia e banda se tornavam em um só, comungando a estupefação, crises de pânico, catarse e vômitos.

Na estrada gravam o “Rembrandt Pussy Horse” (1986) que na arte original da  capa mostra a virilha de uma halterofilista com a calcinha atochada na pepeca e as veias saltando prá fora. Sem nomes de músicas ou fotos da banda, que era para não estragar a "pureza artística do trabalho", o disco segue a trajetória dos anteriores e é paulada na moleira,  nada a ver com nada, prá louco pirar, insanidade pura. Nesse ano conseguem uma turnê caótica pela Europa, em que o Gibby corre pelado entre o público durante um festival na Holanda, apanha muito (inclusive da banda do Nick Cave) e no final saem consagrados!!!! Não entenderam nada.
 

Conta-se que os integrantes compunham, gravavam, se apresentavam e viviam o tempo todo sob estados alterados da mente, usando todo tipo de droga e vivendo na mais absoluta paranóia. Na situação de penúria em que se encontravam, chegaram a lavar pratos e catar latas de alumínio para sobreviver, vivendo por muito tempo se hospedando na casa de amigos de cidades por onde passavam e coletando comida no lixão. Algumas histórias são curiosas, como a que sem mais nem menos se mudaram para Athens, Geórgia e por lá ficaram por 6 meses,  na tentativa (frustrada) de fazer contato com o R.E.M, primo rico dessa geração de bandas, que tinha um pé no punk mais buscava raízes melódicas/ideológicas/espirituais no  classic rock das décadas de 60 e 70.
Teresa Nervosa: uma das bateristas do BS



As coisas começam a melhorar um pouco a partir de 1987, com o lançamento de "Locust Abort Technician", considerado por muitos como sua melhor obra, um passo a frente em matéria de produção e conceito artístico; e que mais recentemente foi incluido no famoso livro “1001 discos para ouvir antes de morrer”. A faixa de abertura, uma zuera em cima de ‘Sweat Leaf’ do Black Sabbath e com o mote: “É melhor se arrepender do que você fez do que do que você não fez” talvez seja o momento mais marcante de um álbum só de acertos. A imprensa britânica saudou-os como revelação do ano. Gravam em 1988 o "Hairway to Steven", que é uma espécie de continuação do "Locust..." mas sem o o mesmo impacto e o ao vivo “Double Live” (que contém uma versão bizarra de "The One I Love”, do R.E.M.).



A banda entra nos 90’s passando por crises. O momento é propício para eles mas com as sucessivas mudanças de formação e abuso de drogas dos integrantes, começam a mostrar sinais de cansaço. Gravar por uma major também não ajuda muito e os discos ”Pioughd”, “Independent Worm Saloon” e “Electric Larryland” passam um ar burocrático. Apesar de ótimos momentos musicais nos discos citados, assim como apresentações memoráveis como a  Lollapallooza de 91(essa lembrada pelos tiros de rifle disparados) já são uma banda bem mais estudada e linear.

Desde 2010 que não gravam nada e também não andam fazendo shows, mas os Surfistas do Cu não acabaram oficialmente e há boatos de um retorno aos palcos, o que é desmentido pelos integrantes. Seja do jeito que for, a única certeza é que isso acontecer será esquisito e marcante de qualquer forma.

Negromancy - Blues, Satanismo, Black Metal e Cigarboxes

E aí pessoal, faz um tempo que não postamos e tudo mais. Tiramos algumas férias mas vamos voltar a escrever, além de algumas novidades legais que temos em mente que finalmente poderão sair do papel. Enfim, vamos ao post de hoje.


Hoje o post vai sobre um selo norueguês muito curioso: Negromancy. Inspirado pelas gravações lo-fi dos Les Legions Noires, mais as lendas satânicas de Robert Johnson e o delta blues do Mississippi, esse selo criou uma onda de músicos que fazem Black Metal com influência de blues e o uso de cigarbox. O que é um cigarbox? Bem, quando o blues surgiu nem todos os músicos poderiam criar guitarras, então alguns músicos faziam suas próprias guitarras com pedaços de pau, uma caixa de charutos usada e cordas de vassoura.


Com essa lógica o selo criou o conceito de "black metal crioulo" e usa de imagens blackface, satanismo, corpse paint invertido e uma sonoridade lo-fi absurdamente sombria. Apesar do pouco tempo de vida, Negromancy lançou vários materiais em fitas k-7 (todas limitadas a 33 cópias) e já tem um cast considerável. Além das fitas, o selo também ensina como você criar seus próprios instrumentos. Abaixo vou falar sobre alguns artistas, pois mesmo com esse conceito, há um elenco bem notável de músicos no selo:

OEDE


Primeiro grupo e também o originador do selo e conceito do Negromancy. Esse músico Norueguês faz o resumo da proposta, black metal com a gravação lo-fi e influência de blues de nomes como Robert Johnson e Leadbelly. Ao mesmo tempo que há músicas cruas, sujas e malignas, haverão canções de blues muito bem trabalhadas que farão você se sentir em 1920, há também algumas faixas com canções nórdicas ou coros, ambientação é um termo que você vai ouvir bastante nos grupos desse selo. Você pode checar o primeiro full dele aqui.

VVLAD


Também da Noruega, VVlad aposta mais no blues que seu conterrâneo, a natureza lo-fi da produção já o ajuda a criar um pouco mais de flertes com o noise em algumas faixas. Porém quando o assunto é fazer Black Metal, ele o faz com maestria, usando blast beats poderosos e vocais gravados de maneira tão rústica e distorcida que deixaria qualquer fã de LLN enlouquecido. Aqui no bandcamp você pode ouvir quase toda a discografia de VVlad, talvez o mais prolífico de todos do selo.

NÉKRHÄRKH


Vindo da França, era uma Banda de black metal no molde das legiões negras francesas, porém recentemente mudou seus instrumentos e abraçou as idéias do Negromancy para fazer sua música com os requintes de blues. Gritos desesperados, baterias pesadas, reverbs, harmonicas e cigarbox conjurando a pura bruxaria pantanosa. Você pode checar o tape aqui

VERMAPYRE


Projeto que inspirou  o selo, começou basicamente como uma banda de raw black metal/ambient que montaria seus próprios instrumentos, criando trilhas sonoras para filmes de horror antigos. O único dos projetos que faz apresentações ao vivo, normalmente acompanhadas de um telão rodando um filme feito e montado pela própria banda, os músicos improvisam a trilha para o mesmo.


Ok, tem alguns que deixei de lado, mas é mais por não ouvir ou não ter material o suficiente dos caras para uma avaliação justa. Mas vale a pena checar o bandcamp dos caras onde há todos os lançamentos e para downloads de graça. Agora prepare sua cadeira de balanço, pegue a espingarda e olhe para os horizontes do pântano enquanto sente satã se aproximar.