Sérgio Sampaio: Não há nada mais bonito do que ser independente



A trajetória musical de Sérgio Sampaio é das mais inusitadas dentro da nossa música popular, ou impopular, como queiram. Incompreendido na época em que viveu, a cada dia ganha mais fãs e admiradores via internet. Entrando no inconsciente coletivo popular com um hit bombástico (“Eu quero é botar meu bloco na rua”, de 1972) e nunca mais conseguindo repetir o êxito ou mesmo manter uma carreira regular, ganhou o título de “maldito” tanto pelos excessos etílicos/cocainômanos quanto por uma poesia que privilegiava os aspectos mais sombrios da vida e da humanidade.
 
Filho de pai maestro, cantor e compositor, Sérgio desde cedo teve interesse por música. Seu relacionamento tempestuoso com o pai marcou toda sua vida e carreira. Isso mais o isolamento geográfico (capixaba de Cachoeiro de Itapemirim, terra do Roberto Carlos e longe  dos grandes centros culturais) podem dar uma pista das origens da personalidade hedonista e arredia do artista.
 
Sociedade da Grã Ordem Kavernista
A grande guinada na vida de Sérgio foi sua mudança para o Rio de Janeiro no final da década de 60 , onde conheceu as melhores mentes da contracultura nacional e virou hippie. Tendo gravado alguns compactos e dono de uma imagem bastante dropout chamou a atenção do até então produtor musical Raul Seixas. Raul gravava artistas bregas e românticos mas queria desesperadamente fazer um disco anárquico e avant garde, nos moldes do que o Frank Zappa havia fazendo lá fora. Além de Sérgio, Raul também recrutou uma bichona, Eddy Starr; e uma sambista de interpretação nada convencional, Miriam Batucada. O quarteto gravou o  antológico “Sociedade da Grã Ordem Kavernista”, um dos grandes tesouros perdidos do nosso udigrudi.
 
Raul Seixas e Sérgio Sampaio durante a gravação do primeiro álbum-solo de Sérgio
A amizade de Raul com Sérgio rendeu muita bebedeira, pó e putaria pelas ruas do Rio de Janeiro, com Raul uma vez afirmando que perto de Sérgio Sampaio, ele se sentia um coroinha. Além disso Raul Seixas também produziu o primeiro LP solo de Sérgio, “Eu quero é botar meu bloco na rua”, que aproveitava o título do compacto de sucesso lançado por Sérgio um pouco antes . É o disco mais rock dele e também o mais instantaneamente fácil de gostar.  A base musical de Sérgio Sampaio eram o samba e os boleros de Nélson Gonçalves mas o resultado rock ficou orgânico, como mostram a mais raulseixista do disco, “Viajei de trem”, repleta de imagens poéticas drogadas e a empolgante “Filme de terror”, primor de interpretação, letras e arranjos. Há também influências do  Caetano Veloso tropicalista por todo o álbum, como em “Leros e boleros”. Sua relação de amor e ódio com seu pai rendeu duas obras-primas: a misógina “Cala a boca, Zebedeu”, regravação do velho e “Pobre meu pai”, um acerto de contas com o passado dos mais dolorosos. A capa também chama atenção, com Sérgio posando de vampiro andrógino e o logotipo do seu nome em vermelho pingando sangue. Sérgio, grande fã de Edgar Allan Poe, Baudelaire, Augusto dos Anjos foi talvez nosso maior gótico.
 

Em 1976 mais um disco, “Tem que acontecer”, em que a faixa-título é uma lamentação a mais um fim de relacionamento amoroso fracassado (ele teve muitos). Esse disco é mais ligado ao samba e à tradição dor de cotovelo. “Velho bandido” é a grande obra-prima do disco, onde não se sabe onde termina o personagem e a persona do próprio Sérgio.  
 

Somente em 1982 é que ele gravaria  um novo LP, chamado de “Sinceramente”, um disco menos carregado emocionalmente e que pode ser interpretado como uma tentativa de sobriedade (“Homem de 30”). Lançado de forma independente, é um disco, mais intimista que os anteriores e cheio de grandes pérolas (“Nem assim”, “Tolo fui eu” , o lindo arranjo de sintetizadores de “Meu filho, minha filha”...).
 

“Sinceramente” foi também seu último LP, passando daí por diante a sofrer cada vez mais as consequências de uma vida de excessos e é também o momento mais crítico de sua decadência. Fazendo shows esporádicos (Sérgio não tinha organização para gerir sua carreira) e mergulhando em vícios e paixões, lançava materiais esparsos. Apesar disso, planejava seu grande renascimento das cinzas, o que nunca aconteceu. Bastante irregular, alternava grandes êxitos, lotando algumas importantes casas de show pelo Brasil e outros de miséria, necessitando da ajuda de amigos e parentes para sobreviver.
 
Sua situação com as drogas o levaram a sucessivas internações. A última foi em 1994, em que morreu de pancreatite aguda.
 

Deixou considerável material inédito gravado, que é compilado por Zeca Baleiro e se transforma no CD “Cruel”como tentativa de manter viva a memória do artista e que contém também algumas de suas melhores músicas, como “Roda Morta”, uma de suas mais conhecidas e apreciadas.
 

Em tempos de trabalhos musicais rasos e ralos, ouvir algo tão denso e pungente tem efeito devastador, pro bem e pro mal. Qualquer tempo gasto com Sérgio Sampaio não é em vão. Autoral, entregou a alma como poucos e  fez sua música ter outra dimensão.  Não fazendo concessões e não dando trégua ao ouvinte, é um dos contatos mais íntimos através da música que se possa ter. É o máximo que podemos suportar de treva e beleza.

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Catharsis - Quando o hardcore se torna épico...


Dessa vez no Bad Music farei um post de uma banda que acho deveras especial, falaremos de um grupo de músicos que deu um novo molde ao hardcore, vamos falar dos americanos do Catharsis. O grupo é conhecido pela participação de alguns membros no coletivo anarquista Crimethinc, que lança discos e livros independentemente, além de manifestos sobre liberdade individual. Como tenho pouco conhecimento sobre o material desse coletivo, pretendo focar esse post apenas na banda e sua musicalidade, vamos lá então:


Formado em 1994 em Chapel Hill, Carolina do Norte, o grupo constava com Brian Dingledine nos vocais e Alexei Rodriguez nas baquetas, além Mark Dixon e Christopher Higgins assumindo baixo e guitarras respectivamente. Com essa formação gravaram a demo Fall, que já demonstrava uma mescla de hardcore com timbres e andamentos mais típicos do metal. Depois de mudanças na formação, foi gravado um EP em 1995 e um álbum em 1996, ambos tendo o nome da banda como título. 


Nesses trabalhos nota-se que uma evolução no som do grupo, os vocais de Brian estão cada vez mais rudes e tendendo aos guturais ao invés de meros gritos típicos da cena na época, Alexei já começou a fazer linhas de baterias com bastante bumbo duplos. Nas influências de notam toques de Integrity, Starkweather, His Hero Is Gone, Breakdown (o qual fazem um cover) e até mesmo Amebix. Depois mais mudanças ocorreram na formação e assim começam as gravações do seu segundo álbum: Samsara



Samsara saiu em 1997 e já chama a atenção na primeira faixa, com um canto de ópera e pianos seguidos de um feedback, seguido da faixa Exterminating Angel, com isso já notamos que o Catharsis demonstra uma evolução sonora gigantesca. A ausência de refrão, mudanças de tempos, trechos em spoken word, blast beats e pedais duplos. As letras de Brian contem letras apocalípticas com mensagens políticas e anarquistas sobre a sociedade, ambiente e as transgressões que certas evoluções causam. Outro detalhe curioso nesse álbum é a existências de faixas com mais de 6 minutos (o que é absurdo quando falamos de hardcore), e nessas composições nota-se um quê de Neurosis.


Depois de Samsara, o grupo lançou o split Live In The Land Of The Dead que tem duas versões: uma com os americanos do Gehenna, outra que saiu numa colaboração com o selo brasileiro Liberation na qual eles dividem o split com os paulistas do Newspeak. Ambos os splits contem as mesmas canções ( The Sacred and Profane, What The Thunder Said e a arrastadíssima e atmosférica Unbowed).


Em 1999 o grupo lança seu terceiro álbum, Passion, dedicado ao guitarrista Dan Young que morreu durante as gravações. Agora o som está completamente amadurecido, as epopéias hardcore que seviam em Samsara atingem seu ápice aqui, faixas divididas em partes (como as dobradinhas Passion.../...Obsession e a Threshold com Duende). Faixas extensas, riffs arrastados, mais trechos declamados e até mesmo a existência de um reggae para quebrar o clima apocalíptico do álbum, Deserts Without Mirages, na qual Brian diz ser influenciado por Peter Tosh, além da canção ter declarações de uma música de Goodspeed You! Black Emperor. O álbum se encerra com a obra prima Sabbath (The Dervish Dance), uma obra quase esotérica e sampleando uma canção folclórica búlgara.


Após esse álbum, em 2001 o grupo gravou suas duas últimas canções  Arsonist's Prayer e Absolution, a primeira foi usada para um split com o grupo de post hc húngaro Newborn, enquanto a segunda nunca foi terminada, pois a banda encerrou as atividades. Em 2012 Brian Dingledine e Jimmy Chang gravaram os vocais e guitarras que faltavam em Absolution, em 2013 a banda se reuniu para fazer apresentações e lançaram o box-set Light From A Dead Star, contendo toda discografia da banda. Não se sabe se a reunião gerará um disco novo, mas os fãs ficam na expectativa. Veja um dos shows de reunião abaixo:


E ficamos por aqui, nos vemos no próximo post!

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Deus Salve as Rainhas


O Queens of The Stone Age surgiu em 1996 e originalmente era formado por Josh Homme (V/G), Nick Oliveri (B) e Alfredo Hernandez (D), que eram ex-integrantes do Kyuss, banda que anos antes havia tido grande louvação pela crítica porém havia passado despercebida pelo grande público. A gestação do QOTSA ocorreu durante o que ficou conhecido como “Desert parties”, que eram jam sessions intermináveis organizadas pelo trio e feitas no meio do deserto californiano utilizando um gerador (qualquer semelhança com o Pink Floyd em Pompéia é mera coincidência!). Artistas das mais diversas vertentes musicais eram convidados para essas jams e nesse clima experimental inclusivista, foi de  onde surgiu a proposta mais universal do QOTSA.  A idéia era pegar o stoner rock ( subgênero de bandas que se inspiravam e também copiavam o som saturado e psicodélico de Black Sabbath e Blue Cheer) e fazer música com apelo moderno, que tivesse substância mas fosse também acessível ao ouvinte médio. Essa contradição arte/mercado foi e  é um dos principais charmes da banda, que era prá se chamar “Kings of the Stone Age”, mas que o nome foi considerado machista demais e ficou “Rainhas...”, que era mais de boa.
 

O primeiro material gravado veio em 1998, autointítulado. O disco da calcinha é o mais cru e despretensioso deles. E já de cara uma obra-prima! Os vocais sussurados e riffs robóticos de Homme (uma das abordagens mais criativas do instrumento desde a invenção da guitarra elétrica), o baixo estilo mamute de Oliveri e a bateria simples e eficaz de Hernandez trabalham em cima de composições perfeitas, misteriosas e lascivas. Nesse período tocavam em botecos e pequenos festivais, nem imaginando no que se tornariam. Mas como dizem que quem tem amigos não precisa de dinheiro, Josh Homme tinha alguns amigos e famosos, sendo Dave Grohl o maior deles. Tiete do Kyuss e grande divulgador dos artistas que gosta, não deixava de tecer elogios ao QOTSA quase que a cada entrevista do Foo Fighters.
 

Com excelentes críticas e a base de fãs crescendo consideravelmente, veio dois anos depois "Rated R". Já com vontade de conquistar um público maior, a banda vem com um som mais acessível, dando ênfase em refrãos e apostando na variação de vocalistas: Oliveri assume o vocal principal de diversas faixas, geralmente as mais punk estilo fio desencapado. É chamado também o ex-Screaming Trees Mark Lanegan, que faz uma espécie de irmão mais velho de doideira dos caras e que colaboraria também nos trabalhos posteriores. Uma curiosidade é que Josh Homme participou como músico contratado na última turnê dos Trees. Com um hino (a louvação às drogas “Feel the good hit of summer”, com direito a backing vocals do Rob Halford), esse disco teve bastante aclamação lá fora, o que fez com que passassem pelo Brasil no Rock In Rio 3, em 2001, numa desastrosa apresentação, onde os colocaram para abrir para medalhões do metal como Sepultura e Iron Maiden e sofreram total falta de respeito do público. Um fiasco, o que levou a banda a demorar quase 10 anos para voltar ao Brasil novamente.


Em 2002 há uma das mais felizes combinações musicais, como também uma senhora estratégia de marketing: Dave Grohl grava um disco com a banda. Não só um disco, mas o maior álbum do milênio até agora. Era só o que o QOTSA precisava para ganhar o status de mega, com o baterista de uma das bandas mais influentes de todos os tempos dando aquela força. Mas de nada adiantaria a ajuda de Grohl se o material não fosse de primeira. E “Songs for the deaf” com sua atmosfera freneticamente tensa, bruta, cínica e escapista é um arregaço, não deixando pedra sobre pedra. Durante a turnê de "Songs...", Nick Oliveri sai da banda, o que redirecionou o som do grupo e  repercute até os dias de hoje. Sim, o cara faz muita falta!
 

Um clima deprê é a tônica do próximo lançamento, "Lullabyes to paralise". Apesar de ter algumas músicas muito boas, no geral  é um álbum arrastado e o primeiro vacilo na carreira deles.
 
Natasha Shneider, a tecladista de origem russa que ajudou a formar a cara do Queens pós-saida -do-Oliveri. Morreu precocemente de câncer aos 52 anos, em 2008, sendo homenageada com um show. 
Com as críticas fracas e estranhamento de boa parte dos fãs, Josh concentrou forças para o lançamento do próximo álbum, o ótimo "Era Vulgaris", que é bem mais rock e que consegue manter o nível pelo disco todo, tanto por algumas músicas que viraram hits da banda como por pérolas escondidas por todo o álbum.
 
QOTSA versão 2014
Um hiato de 5 anos e em 2013 vem o aguardado “Like clockwork”, num estilo paradeira que remete ao clima do “Lullabyes to paralise”. Mesmo assim é obrigatório, como todo disco da banda, possuindo composições fortes e emocionantes. Para a turnê desse disco o  QOTSA vem ao Brasil pela quarta vez para duas apresentações, o que sempre causa bastante expectativa e  furor. Verdade seja dita, depois da saída do Oliveri a banda nunca mais foi a mesma, mas até esse QOTSA mais domesticado que anda pela Terra é infinitamente superior e mais interessante a tudo o que o aconteceu no rock mainstream depois do surgimento deles. Josh continua tocando o puteiro!

O que que tá pegando? (Rio Grande do Sul)


Finalmente, depois de um BOM tempo sem escrever nada por aqui, faço meu retorno. Bem, estou nos momentos finais de minha faculdade e antecipei minha monografia, por isso me ausentei da página por um tempo, mas vamos ao que interessa agora.

Já tava a um tempo planejando fazer esse post, creio que vai ser uma parada meio mensal ou rotineira, pois quero fazer dessa coluna um boletim sobre o que tá rolando aqui no estado ( no melho estilo "Scene Report" da Maximum Rocknroll). Sem falar pros leitores de outras regiões saberem o que rola de bandas interessantes por aqui. Vou tentar ser o mais amplo possível e falar até de gêneros que não é de praxe da nossa página, então vamos lá:


SNOW TWINS


Vindos de Osório, eles são uma dupla (ou casal, como preferir chamar) que, mesmo com um visual e formação que fazem parecer que são um White Stripes da vida, vão destruir suas expectativas. O som dos caras é um garage rock fuderoso, no melhor estilo Detroit 69 que deixariam os Stooges e MC5 orgulhosos. No momento eles tem um álbum e 2 músicas novas, quem quiser escutar e acompanhar os caras é só ver o facebook deles para mais informações. Pois o rock'n'roll está vivo e muito bem, obrigado.


DEVIR


Vindo de Santa Cruz do Sul, o quarteto faz um hardcore/post hardcore na vibe de grupos como Husker Du, Cap'n'Jazz e At The Drive In ( além de um arzinho D.C. da linha do Rites Of Spring, Embrace e afins). Arranjos simples, melódicos e bem construídos, letras bem escritas e com assuntos até curiosamente politizados pra o gênero, como legalização da prostituição(PL 98/2003) e a vida de crianças em zonas de guerra( Forgotten). Os caras agora lançaram um álbum com 7 canções que pode ser escutado e baixado de graça neste link, quem quiser saber mais informações da banda só seguir o facebook dos caras.



INFINITUM 


Saindo um pouco do eixo de sons mais hardcore/roque selvagem/metal do blog, vamos falar da Infinitum. O quinteto de Porto Alegre é do polêmico(?) gênero do metalcore, mas o grupo tem uma vibe um pouco diferente do esperado. Os breakdowns e vocais melosos estão ali? Sim, estão, mas o modo que eles são elaborados saem um pouco das fórmulas permeadas que permeiam o estilo, sem falar dos assuntos das letras, no caso do single Aames, cujo nome e conceito foram inspirados pelo filme Vanilla Sky. No momento eles estão para lançar um EP, mas o grupo já tem 2 músicas na rede e quem quiser acompanhar ou saber mais dos caras só seguir o facebook deles. Para quem curte um som na pilha de bandas como Architects, Northlane, Tesseract e A Última Theoria, sinta-se servido.




ALÉM DO FIM


Mais uma da curiosa safra metalcore que tem por aqui, com influências que vão da nova geração do gênero como Parkway Drive e While She Sleeps, passando pro deathcore do Suicide Silence e Chelsea Grin e tentando trazer um pouco do tal do djent praticado por bandas como Volumes e Northlane. Os caras já lançaram um EP ano passado e o debut está pra sair esse ano, para mais informações do grupo só seguir o facebook dos caras. Mais um nome diferenciado pra geração que prefere breakdown, vale lembrar também que o EP dos caras estava na minha lista de melhores lançamentos de 2013.


ROTTEN FILTHY


Thrash/Death de Cachoeira do Sul, a banda tem uma influência dos sons do Cavalera (Soulfly, Sepultura, Nailbomb) e toda geração mais moderna do thrash, como Machine Head. Mas mesmo de tanto metaleirismo, há uma influênciazinha hardcore. Os caras lançaram um EP chamado Empires Will Fall e ainda esse ano também lançam o seu primeiro álbum, Inhuman Sovereign. Quem quiser saber mais dos caras só checar o facebook deles.


BAD TASTE



Death Metal massacrante de Cachoeirinha. Na vibe de monstruosidades como Cannibal Corpse, Dying Fetus e Decapitated os caras fazem uma sonzeira brutal, rápida e técnica sem soar entediante, trilha perfeita para quebrar dentes. Os caras já tem um EP e estão compondo músicas para um trabalho novo, na qual um dos singles já saiu. Mais informações da banda só acompanhar o facebook do grupo.




EVERYONE GOES TO SPACE



O trio porto alegrense faz um pop punk/emocore na linha das bandas clássicas do gênero como Jawbreaker e Sunny Day Real Estate, extremamente melódico simples, calmo e relaxante. A demo é um daqueles discos que você dá o play, fecha os olhos, se deixa levar pela música e milhões de pensamentos passam pela cabeça. Aqui está o facebook dos caras para saber mais, desfrutem.


DPSMKR



Um cara (ou mais) de Porto Alegre, uma guitarra, muita psicodelia e loops. Não preciso dizer mais nada, dá o play e se deixe levar pela chapação sonora do cara, em 3 anos de existência o projeto já teve 6 "álbuns" que podem ser baixados e escutados online no bandcamp dele. Dpsmkr também lança alguns materiais físicos, mas são em quantidades absurdamente limitada (o debut tinha 20 cópias, por exemplo), acompanhado de fotos. O negócio é uma experiência audiovisual hipnótica e transcendental, escute pelo menos uma vez apenas pela experiência. Aqui tá o facebook para mais informações, caso queira cópias do cd ou ver algum dos raríssimos shows do projeto.


Por enquanto é isso, haverão outras sessões do "Que que tá pegando, RS?", pois tem MUITA coisa que deixei passar, creio que farei isso mensalmente (ou bimestralmente). Nos vemos na próxima e espero que curtam minhas trocentas recomendações, apoie a cena que você acha que merece ficar viva.

O mundo de Andy

                                

Espalhafatoso, carismático, dono de interpretação privilegiada, grande performer Andrew Wood é um das figuras mais geniais que Seattle deu ao mundo. Mais conhecido como o sujeito que morreu de uma overdose e foi homenageado por um coletivo grunge num disco, seu trabalho ainda continua nos guetos da música.

O primeiro amor de Andrew pelo rock veio com o disco Alive I, do Kiss. Através dele, toma contato com o universo do glam rock que iria formar a base de sua personalidade musical: T-Rex (Marc Bolan era tudo o que ele queria ser), o hard rock swingado do Aerosmith e o senso melódico e baladas no piano do Elton John.

No início dos anos 80 forma com seu irmão Kevin e mais um amigo o Malfunkshun. A exemplo do Kiss, cada integrante era um personagem e suas apresentações tinham grande apelo visual, com Andrew abusando da maquiagem e purpurina. Foram uma das primeiras bandas de uma geração que mais tarde seria conhecido como o cenário grunge, ao lado do Melvins, Green River e Soundgarden, dentre as que ficaram mais conhecidas.
"Deep Six", coletânea de 1986 com as primeiras bandas do que viria a ser conhecido como a cena de Seattle. O Malfunkshun participa com duas faixas.
O cenário musical  de Seattle na década de 80 foi bastante influenciado pelo Flipper e por um show do Black Flag na cidade, da turnê de “My War”; e as bandas tendiam a fazer um som arrastado e cheio de dissonâncias. O Malfunkshun com seu som puxado para o arena rock era um estranho no ninho. Ao contrário da grande maioria das bandas da cidade, Andrew queria fazer sucesso no mainstream e tinha postura de rock star. Mas a presença, vivacidade e senso de humor dos shows garantiam que fossem não só aceitos, mas também amados e cultuados  na região.


Apesar do excelente material que a banda possuía, durante sua existência o Malfunkshun não teve nenhum disco lançado. Somente em 95 esse material é compilado no impressionante  cd  “Return to Olympus”. Rock glamuroso, punk e art rock numa mistura única. Cacoetes guitarrísticos da década de 80 (shred guitar) funcionando perfeitamente em uma proposta artística ousada, com os vocais e versos de Andrew mostrando dor e vivência absurda para quem beirava os 20 anos. “I know my name is Pain, but I can only, be myself...”
                             

O fim do Malfunkshun em 88 coincide com o do Green River também. Andrew Wood se une então aos ex-GR Stone Gossard (G), Bruce Fairweather (G) e Jeff Ament (B) mais o baterista Greg Gilmore e forma o Mother Love Bone. A outra metade do Green River viria a ser o Mudhoney.
Mais direto ao ponto, bem produzido e com clima mais up, o Mother Love Bone foi concebido para competir com as grandes bandas hard do período. O momento era propício. O Guns N’ Roses havia conseguido extrair uma proposta mais artística e rueira para o rock de laquê com seu disco “Apettite for Destruction” e Andrew almejava algo nesse sentido.
                       

O Mother Love lançou dois discos: o EP Shine e a obra-prima “Apple”. É o que de melhor já foi feito em hard rock: um som prá galera mas cheio de alma, boas idéias e uma fluidez de deixar atônito.  A produção de Terry Date (Pantera, Soundgarden, White Zombie) fez tudo soar bem na cara. Uma cacetada!

Infelizmente não tiveram grande sorte: os problemas com drogas de Andrew (que vinham desde os 7 anos de idade!) levaram a sua morte por overdose de heroína em 1990, aos 24 anos. A poucos meses antes do lançamento de “Apple” e do estouro mundial do grunge. Descrito como um palhaço triste pela família e amigos, Andrew disfarçava sua depressão e fragilidade emocional com um lado brincalhão e expansivo, como é mostrado no filme “Malfunkshun -The Andrew Wood Story”.
                                   

O trágico acontecimento deixou Seattle desolada. O amigo de longa data Chris Cornell (chegaram mesmo a dividir um apartamento) tem a idéia de lançar um disco-tributo junto a diversos músicos de Seattle. Isso se torna o Temple Of The Dog, que lança um álbum epônimo um ano depois da morte de Wood.

Ouvir o trabalho de Andrew Wood em 2014 faz todo o sentido. Passados quase 25 anos desde que morreu, a música que produziu continua instigante e atemporal (como toda boa música). Mais do que nunca, a abordagem  personalíssima e espírito inquieto conduz o ouvinte a um universo bem peculiar. Eternal life to the Love Child!

Peter Laughner: Coração das Trevas


Dentre as muitas injustiças e faltas de reconhecimento da história do rock, poucos casos são tão tristes quanto ao do genial Peter Laughner. Músico, compositor, poeta, escritor, "scenester", Peter foi uma das melhores cabeças do punk rock americano dos 70’s e foi esquecido tanto por bíblias como o livro “Mate-me por favor” quanto  pelas bandas em que ele foi diretamente responsável pela criação.
 
Peter Laughner foi  integrante e idealizador do lendário grupo pré-punk  Rocket From The Tombs, que das suas cinzas se originaram duas bandas cruciais para o punk rock: Dead Boys e Pere Ubu. 
 
Peter Laughner (primeiro da esquerda para a direita) com o Rocket From The Tombs
Para se ter idéia do moral do cara, sua morte foi lamentada pelo lendário crítico musical Lester Bangs. Bangs era extremamente iconoclasta e desdenhou da morte de medalhões como Elvis Presley e John Lennon. Mas sente profundamente a perda de Laughner em um de seus textos.
 
Da mesma forma que Bangs, Laughner também era adepto do estilo “gonzo”: encher a cara de cachaça e droga, aprontar um monte de merda e escrever suas experiências no ritmo do fluxo de pensamentos. Um exemplo disso é uma crítica sua do disco “Coney Island Baby” do Lou Reed, para a revista Creem. Peter conta que não gostou do disco, ficou alcoolizado por 3 dias, quebrou a casa toda e caiu na porrada com a esposa, por causa de um vidro de diazepam. A vida dele foi sempre assim: passional, exagerada e decadente; culminando na sua morte precoce aos 24 anos de pancreatite aguda.
 

Os registros gravados do Laughner são seu material com o Rocket From the Tombs e a irrepreensível coletânea “Take The Guitar Player For A Ride”. “Take...” é um clássico perdido, sendo metade das gravações  magníficos lo-fi  de voz e violão e a  outra metade elétrica, abordando suas participações em várias bandas anteriores ao Rocket From The Tombs e covers.
 

Há influências gritantes de Bob Dylan ("Cynderella Backstreet" é a melhor música que o Dylan não fez), belas homenagens às suas inspirações literárias (Baudelaire e à escritora americana Sylvia Plath), baladas junkie perfeitas ("Only Love Can Break your Heart" e "Amphetamine") e versões fenomenais tanto para clássicos que ajudou a compor (“Ain’t no fun”, “Life Stinks”) quanto para de compositores alheios (“Calvary Cross” do inglês Richard Thompson, “Baby’s On Fire", do Brian Eno).
 
A proposta de Laughner era fazer canções com letras profundas e "cabeça" como as do Lou Reed mas com a intensidade emocional do Iggy Pop nos Stooges. Conseguiu! Para quem gosta do estilo “trovador solitário” de artistas como  Dylan, Reed, Leonard Cohen e o agora cult Sixto Rodriguez,  Peter Laughner é um prato cheio. E também o é para os admiradores de uma boa sujeira de forma geral. Aprecie sem nenhuma moderação. Como faria o Mestre!

A Fúria Melódica do Hüsker Dü


                   
O Hüsker Dü foi uma das bandas mais visionárias e corajosas do harcore americano, desafiando um público que tendia a valorizar um purismo exagerado e avesso a maiores inovações musicais. Onde havia a preocupação com o sentimento tribal, o “movimento”, eles faziam música para indivíduos. Onde havia ortodoxia com ênfase em uma postura agressiva, o som deles era confessional e expunha medos, fraquezas e dúvidas. Até esteticamente o Hüsker Dü era bem peculiar: um sujeto com cara de frentista, outro bigodudo com jeitão de viado  mais um riponga com cabelão que tocava bateria descalço não era lá o que se esperava de uma típica imagem punk!
Logotipo do HD; o círculo simboliza a banda, as três listras horizontais os integrantes e a vertical a corrente comum de pensamento 

O Hüsker Dü surge em ’79, tendo a liderança dividida pelo guitarrista/vocalista Bob Mould e pelo baterista/vocalista Bob Mould e que eram habilmente amparados pelo baixista Grant Norton. Amavam a "blank generation" e os Ramones acima de todas as coisas,  mas também eram fortemente ligados nas melodias doces e texturas psicodélicas feitas na década anterior.
No início só tiravam covers, e é de um desses covers, “Psycho Killer” dos Talking Heads, que surgiu o nome da banda.  No verso “psycho killer qu'est-ce que c'est" eles não sabiam pronunciar a parte em francês e faziam brincadeiras com isso. Alguém disse ”Psycho Killer, Hüsker Dü” e o nome pegou. Hüsker Dü é o nome de um jogo de tabuleiro para crianças e que em sueco significa “você se lembra?”.
Hüsker Dü: o jogo
Após assistirem a um show do Black Flag, enxergam no hardcore algo novo e decidem seguir também por esse caminho. Logo gravam o ep ao vivo “Land Speed Records” e o LP “Everything falls apart”. Esses dois discos são um mar de feedback, vocais abafados e bateria atropelando tudo, sendo muito distantes do estilo que os consagrou. Mesmo seguindo uma fórmula mais convencional de muitas bandas do período, o Hüsker Dü era “diferente”.
                                            

Já logo no início essa diversidade começou a  se manifestar e passaram a se sentir desconfortáveis com o aspecto doutrinário do hardcore. Isso se reflete no próximo lançamento “Metal Circus”, onde aparecem os traços mais fortes da personalidade musical do Hüsker Dü: ênfase nas melodias e na criação de canções marcantes. A mórbida balada “Diane” (que recebeu muitos covers através dos tempos) é o maior exemplo disso. “Real world” e “It’s not fun anymore” são críticas a utopia e falta de senso de humor que povoavam os guetos punk/hc.
                           

No ápice da ambição criativa, decidem fazer o primeiro disco duplo conceitual de hardcore, contando a história de um adolescente que foge de casa, tem todo tipo de experiências e retorna “transformado” pelo conhecimento adquirido. Álbuns duplos e ainda por cima óperas-rock eram a antítese do que o Punk Rock representava, sendo associados com a megalomania da década de 70. Mas tão logo "Zen Arcade" foi lançado em 1984, redefiniu todo um estilo, sendo considerado até hoje um dos discos mais representativos já feitos. Em músicas vigorosas como “Something I learned today”, “Chartered trips", “Whatever”, “Broken home, broken heart”  não ficam nada a dever ao melhor do poppy punk praticado por Ramones e Buzzcocks, suas maiores referências. Mas o ecletismo é a principal característica de "Zen Arcade": um impressionante registro só de voz e violão de doze cordas ("Never talk to you again"), uso de piano ("Monday will never be the same") e momentos bastante noise e psicodélicos (“Hare krsna” e os quase 14 minutos de “Reocurring Dreams). O Minutemen (da SST Records também) se inspirou nessa idéia de um disco duplo e assim “Zen Arcade” e “Double Nickels and dimes” foram lançados no mesmo dia, uma estratégia de marketing que ajudou a SST a se afirmar como uma gravadora de vanguarda.
                                          

O Dü lançava discos quase que em seguida, e logo veio "New Day Rising". A faixa-título, com um verso só berrado por Mould e Hart, era um  grito primal, um mantra afirmando que um “novo dia estava nascendo”. A vida na estrada era estressante e turbulenta. E o dinheiro escasso. Os temas foram abandonando a rebeldia adolescente e adentrando um universo adulto, com ênfase em decepções e crises emocionais causadas em sua maior parte por rupturas amorosas. O fato de os  dois compositores principais da banda viverem relacionamentos homossexuais (não entre si, como sempre negaram) num tempo em que isso era bem mais estigmatizado e a AIDS era o “câncer gay” com certeza intensificou sentimentos de rejeição, descrença, abandono e inadequação, que eram a maior parte do universo temático do grupo.
 
Com a inflação de egos promovida  pela imprensa (sempre foram queridos pela crítica) nesse período se acentua uma rivalidade entre Mould e Hart por controle artístico. Mould representava o lado mais carregado emocionalmente e pessimista, enquanto as composições de Hart tinham um tom mais leve, pop e esperançoso. Algo bem semelhante ao que acontecia com a relação Lennon/McCartney.
                            
"Flip your wig", de 1985, disco predileto de Mould, marca o  último lançamento deles por um selo independente e também a opção por um som mais limpo e power pop, que daria o direcionamento adotado pela banda dai para frente.
 
Assinam com a Warner e gravam dois discos pela major. “Candy Apple Gray”  é sensivelmente mais fraco que os três discos anteriores, mas contém algumas de suas melhores músicas: ”I don’t wanna know if you are lonely”, ”Too far down”, “Dead set on destruction” e “Hardly getting over it” são as que eu gosto mais.
Em 1987 vem mais um disco duplo e também uma obra-prima:  “Warehouse: songs and histories”. Com a relação bastante desgastada entre Mould e Hart, "Warehouse" aparenta às vezer ser dois álbuns solo de dois artistas diferentes, mas isso não tira o brilho de canções irretocáveis e atemporais. É também seu último registro. O mais belo canto do cisne que se tem notícia.
O cansaço provocado pela falta de estrutura das turnês, as crises internas (agravada pelo vício de Hart em heroína) e o suícidio do empresário da banda precipitaram o fim da banda na turnê de “Warehouse”.
                                 

Mould e Hart seguem com carreiras-solo atualmente. Ainda se odeiam e não perdem qualquer oportunidade de se atacarem na imprensa. Norton virou dono de restaurante e faz participações esporádicas no meio musical.
O Hüsker Dü é um caso de banda que encerrou atividades no seu ápice e é um das poucas que podem se gabar de não  ter gravado nada ruim. Sua influência nos caminhos seguidos pelo underground é gigantesca: Nirvana, Pixies, Foo Fighters, Green Day tem uma dívida enorme com eles. Infelizmente não colheram os frutos a que faziam juz e assistiram centenas de influenciados e imitadores ficarem milionários com o som que eles desenvolveram. Em  geral  essa é a injusta  sorte dos pioneiros!

Throbbing Gristle: What a Day!

“Aqui estão três acordes, agora forme uma banda’ é a exortação punk. Já começa errado porque começa com acordes. Eles estão dizendo: seja como todo mundo, siga a tradição, você tem que aprender a tocar. Por que não dizer: forme uma banda e não importa como ela soe ou mesmo se vai soar de alguma maneira, você pode até ficar parado em silêncio por uma hora na frente da plateia e ver o que acontece?”

Peter Christopherson, Genesis P-Orridge, Tutti Fanni, Chris Carter
                      
Continuando na trilha do som industrial, que até agora deu a tônica das minhas postagens aqui no blog, escrevo hoje sobre o primeiro grupo industrial de fato (até a gravadora deles se chamava Industrial Records). O Throbbing Gristle foi a primeira banda a usar música eletrônica para trazer desconforto e estranhamento.

O uso da arte como terapia de choque para destruir condicionamentos sociais recebidos desde a infância e a crença em um “Self” puro, o “Eu” original, livre de influências externas sempre foi o que guiou a música e a vida do líder do Throbbing Gristle, Genesis Breyer P-Orridge.
 
Nascido em 1950 em Hull, na Inglaterra, com o nome de Neil Megson, na adolescência P-Orridge descobre  os Rolling Stones e por conseguinte o rock n’ roll. Mergulha então na literatura beatnik e nos grupos mais radicais da contracultura da década de 60, indo viver em comunidades.
 
Genesis P-Orridge circa 1970
Nesse universo de párias e dropouts encontrou a gostosa Cosey Fanni Tutti, que logo virou sua namorada e integrante do grupo artístico multimídia que ele montou em seguida, o COUM Transmissions.  A música era calcada nas propostas de vanguarda que o Frank Zappa e Captain Beefheart vinham desenvolvendo com a mistura de rock, free jazz e humor negro; mas eram suas performances grotescas e atentatórias ao senso comum o que rendia publicidade: Genesis pendurava cabeças de galinhas mortas no pênis, se masturbava conjuntamente com sua namorada em um vibrador de duas pontas, mastigava vermes e cuspia no público dentre outros números que no geral envolviam fluidos corporais e exploração de tabus.Viviam na mais absoluta penúria, sendo que o “P-Orridge” do nome artístico do Genesis é uma referência a uma marca de aveia, que nos tempos de vacas macérricas era o único alimento que eles tinham disponível para mantê-los de pé. Para ajudar a  pagar as contas, Tutti posava nua para diversas revistas pornográficas.
 
Genesis e Cousin em apresentação do COUM Transmissions
Cansado das apresentações teatrais, em 1975 Genesis decide se concentrar somente na música, formando o Throbbing Gristle (gíria para pênis ereto), junto com Cosey e mais Peter ‘Sleazy’ Christopherson, que havia trabalhado como assistente de designer gráfico nos estúdios Hypgnosis e Chris Carter, técnico de iluminação. Cada integrante escolheu justamente o instrumento em que tinham menos habilidade e/ou identificação. Não usavam acordes. Não tinham baterista.
 
Os primeiros shows do Throbbing Gristle coincidem justamente com a explosão do Punk Rock inglês, sendo frequentados e louvados por todo o pessoal do Bromley Contingent, mas Genesis considerava o Punk saudosista e previsível demais e não quis se alinhar. “Não existe anarquia e música ao mesmo tempo” ele dizia e em cima disso abriram mão da melodia e ritmo, dando ênfase na natureza dos sons em si, trabalhando em cima de tons, frequências e camadas de efeitos, como forma de criar hipnose e reações extremas na platéia (até mesmo a defecação espontânea).
 
Os shows do grupo tinham uma natureza tensa e imprevisível. Com uso intensivo de bases pré-gravadas em fitas k-7e vocais muitas vezes em forma de spoken word, as músicas eram criadas e gravadas instantaneamente. “Discipline”, sua obra mais conhecida, pode ser o exemplo mais claro desse estilo de fazer música totalmente ao vivo.
 
                                 

A discografia do Throbbing Gristle é extensa e confusa porque praticamente gravavam (e lançavam) todo material que produziam. Os discos mais representativos são: "Second Annual Report", "Third Annual Report", "20 Funk Jazz Greats" e "Heathen Earth".
 
Causavam repulsa na sociedade inglesa, o que pode ser conferido nas mensagens da secretária eletrônica da banda, expostas na faixa “Death Threats”. Letras tratando de sadomasoquismo ("Discipline"), misoginia ("We hate you, little girls"), pedofilia ("After cease to exist"), masturbação ("Five Knucle Shuffle"), câmaras de gás ("Zyklom B. Zombie") e assassinos em série ("Very Friendly") fizeram deles verdadeiras desgraças sociais. As capas dos álbuns também geravam controvérsia, como a de “Second Annual Report”, em que aparece uma menina impúbere mostra a calcinha numa foto de calendário. Outra digna de nota, “20 Jazz Funk Greats” a banda posa como um  grupo 'easy listening' em uma típica capa de “maiores sucessos”. O que complementa ainda mais a ironia é que essa fotografia foi tirada em  Beachy Head, um penhasco da Inglaterra e que é um dos lugares mais utilizados por suicidas no mundo!
 

Em '78, há uma ruptura entre o casal Genesis/Cousin. O motivo é que Cousin trocou P-Orridge por Chris Carter. Genesis tenta se matar ingerindo tranquilizantes e bebida alcóolica, o que é narrado na letra de “Weeping”: 'Você não me viu chorando pelo chão. Você não me viu engolindo meus comprimidos.'
 
Para tentar evitar que o grupo se dissolvesse e ajudar na melhora do estado mental de Genesis, entra na história Monte Cazazza, que se transforma numa espécie de quinto integrante e mentor intelectual do grupo. Artista avant-gard fissurado em "survivalism" (não existe uma tradução exata em português mas é quem espera e se prepara para qualquer tipo de cataclisma) e armamentos, Cazazza  transforma o TG em uma  banda quase fascista.  Genesis rapa a cabeça e o TG passa a se utilizar de camuflagem e idumentárias militares. No auge da paranóia, que antes era apenas estética, começaram a vender armas, uniformes e kits de sobrevivência pelos correios e idelizaram mesmo criar um grupo paramilitar de seguidores.
 
Monte Cazazza
Com isso a  banda ainda sobrevive por mais um tempo mas as relações entre Genesis, Tutti e Carter estavam insuportáveis prá se continuar, finalizando suas atividades em 1981. Em uma declaração em seu último show, na Califórnia, Genesis disse que “a missão havia terminado”, que o TG havia levado o rock a sair das raízes do blues agrário e criou um novo tipo de musica (ou anti-música) apropriado para a sociedade pós-industrial. Da dissolução do Throbbing Gristle surge dois grupos: Genesis e Peter Christopherson montam o Psychic TV e Cosey e Carter o Chris & Cosey.

Em 2004 houve uma breve e fabulosa reunião dos membros originais para alguns shows, rendendo o fenomenal box de dvd’s “TGV: The Video Archive of Throbbing Gristle”, que contém o melhor dessas apresentações e mais material da década de 70. Infelizmente Peter Christopherson morreu em 2010, inviabilizando outra reunião com os membros originais.

TG nos 00's
O Psychic TV continua em atividade e Genesis continua sendo figura das mais expressivas no underground, sempre aparecendo de alguma forma na mídia alternativa, escrevendo prefácios de livros ou aparecendo em documentários. Suas entrevistas são brilhantes, mostrando boa argumentação e lucidez que impressionam; ainda mais na sua condição de sobrevivente, como ele próprio se denomina. Com o surgimento da internet seu trabalho e do Throbbing Gristle estão sendo descobertos por uma nova geração de fãs e alcançando um nível de reconhecimento que até então era inédito. Antes (bem) tarde do que nunca, com toda a certeza. Industrial Music For Industrial People!